RESUMO: "....A  tese do decrescimento baseia-se na hipótese de que o crescimento  econômico - entendido como aumento constante do Produto Interno Bruto  (PIB) - não é sustentável pelo ecossistema global. Esta idéia é oposta  ao pensamento econômico dominante, segundo o qual a melhoria do nível de  vida seria decorrência do crescimento do PIB e portanto, o aumento do  valor da produção deveria ser um objetivo permanente da sociedade. A  questão principal, segundo os defensores do decrescimento - dos quais  Serge Latouche é o mais notório - é que os recursos naturais são  limitados e portanto não existe crescimento infinito. A melhoria das  condições de vida deve, portanto, ser obtida sem aumento do consumo,  mudando-se o paradigma dominante..."
O QUE É DECRESCIMENTO?
Por Edson Franco
O  avanço do conhecimento humano através do desenvolvimento da técnica e  da ciência tem trazido benefícios para as populações, mas também  conseqüências que não são notadas no início. A conquista de relativa  segurança com a vida se desenvolvendo em torno dos grandes centros  urbanos, o conforto proporcionado pelo fácil acesso a inúmeros produtos  industrializados, a economia de tempo com o uso dos transportes  individuais em uso crescente nos grandes centros urbanos, vem trazendo,  junto com todos os benefícios aparentes, efeitos colaterais bastante  nocivos à sociedade. Dentre esses aspectos talvez seja o meio ambiente o  que mais explicitamente demonstra sentir o impacto desses “avanços”. O  decrescimento é uma proposta para resolvermos esses problemas de forma  profunda e eficaz.
O  conceito de decrescimento não é novo e vem sendo elaborado há muito  tempo por pessoas que pensavam à frente de seu tempo. Na verdade, o  decrescimento é uma evolução conceitual de várias outras propostas  críticas à modernização de nossas sociedades. Já no início da década de  60, Ivan Illich (pensador austríaco) e Rachel Louise Carson (zoóloga e  bióloga estadunidense) alertaram para os efeitos contraproducentes da  economia contemporânea e os possíveis desastres da moderna agricultura  levando à exaustão os recursos naturais, entre outros efeitos nocivos.  Ernst Fritz Schumacher com o livro “Small is beautiful” em 1973 e  Nicholas Georgescu Roegen com os primórdios da conceituação das leis da  entropia da física aplicada à ciência econômica em 1971, até os dias  atuais com Serge Latouche, o paladino do decrescimento, entre muitos  outros, têm desenvolvido o que hoje se apresenta como a proposta do  decrescimento econômico.
           Não poderíamos deixar de citar, mesmo que não totalmente alinhado com o  decrescimento, o nome de Herman Daly, que foi economista chefe do  departamento ambiental do Banco Mundial. Suas idéias podem ser  consideradas como uma ponte para a sociedade alcançar o estágio do  decrescimento. Daly apresenta uma simplificação do conceito de  “deseconomia de escala”, ou seja, algo traz um benefício até certo  ponto, depois desse ponto o benefício agregado é menor do que os  problemas obtidos. É exatamente isso o que está acontecendo com a  economia em nível planetário: os ganhos com produção, conforto, riquezas  e consumo já são menores do que as perdas com degradação ambiental,  estresse e perda de saúde da população em geral.
             Tal desenvolvimento do termo trouxe alguns enganos que devem ser  identificados para não confundirmos com o que não é decrescimento. Um  exemplo é o conceito de desenvolvimento sustentável. O decrescimento  alerta que não é possível um crescimento infinito num planeta finito. A  escassez de recursos naturais, energia, matéria prima, espaços físicos,  entre outros, faz com que o paradigma do crescimento infinito tenha que  ser superado com urgência. Por isso falar de desenvolvimento sustentável  é uma forma de ludibriar e manter as coisas como elas estão, sem  mudanças significativas.
             Uma medida bastante usada pela mídia atualmente é a “pegada ecológica”.  Usado pela primeira vez em 1992 por um professor e ecologista canadense  da universidade de Colúmbia Britânica chamado William Rees, o termo:  “ecological footprint” refere-se à quantidade de terra e água necessária  para sustentar uma determinada população local (geralmente um país)  tendo em vista todos os recursos materiais e energéticos gastos por essa  mesma população. A chamada pegada ecológica da humanidade alcançou  tamanhos alarmantes. O aumento do consumo dos países subdesenvolvidos,  nos índices de consumo dos EUA, representaria a necessidade de termos  mais 6 (seis) planetas Terra, segundo dados do World Wide Fund for  Nature (WWF – Fundo Mundial para a Vida Selvagem e Natureza) de 2006. 
             Isso aponta para mais um problema: a superpopulação. Pesquisas da  Organização das Nações Unidas demonstram que a população no planeta tem  crescido sem parar e deve superar os sete bilhões de pessoas antes do  final de 2011. Segundo dados recentes divulgados em um relatório  elaborado pelo Departamento de Estudos Econômicos e Sociais da ONU, a  população total da terra em 2100 será de 10,1 bilhões de pessoas. A  falta de preocupação com o problema por parte de governos e famílias  aponta para conseqüências ainda mais desastrosas: falta de alimento, de  água e de trabalho para todos são algumas das dificuldades que teremos  de enfrentar em futuro próximo. O aumento populacional que explodiu  depois de 1800, ocasionado pela revolução industrial e pela acumulação  de pessoas morando na cidade em busca de emprego mais fácil do que no  campo, tornou o crescimento das cidades tão desordenado que a vida nos  grandes centros urbanos se tornou um “mal necessário”. 
Algumas  explicações para esse crescimento desordenado estão relacionadas  principalmente a duas causas estruturais: falta de educação de qualidade  e péssima distribuição de renda, no mundo inteiro. Nas duas frentes,  ações governamentais e institucionais que tentam “mascarar” estes  problemas não os resolvem. Na primeira: educação de qualidade, pública  ou privada, é um sonho distante na maioria dos países, ainda que grandes  avanços tenham sido dados em alguns países europeus. No caso do Brasil a  “maquiagem” governamental divulga que temos quase 100% das crianças na  escola, mesmo que elas lá estejam apenas para receber uma merenda e não  recebam uma boa educação formal, até porque muitas escolas não estão em  condições mínimas de uso. Na segunda: uma distribuição de renda efetiva  não significa concessão de bolsas por parte do governo, mas sim,  garantia de acesso à renda efetiva e duradoura através de emprego,  formação profissional e cidadania crítica em todos os níveis sociais. A  situação atual, entretanto, mostra a seguinte equação: 80% dos recursos  estão nas mãos de 20% da população mundial.
             Esse modelo de desenvolvimento praticado até então foi um “erro  estratégico” que trouxe para a sociedade conseqüências como queda na  qualidade de vida, violência urbana crescente, desigualdade social na  maioria dos países, falta de recursos energéticos para suprir a  necessidade de megalópoles cada vez mais barulhentas, apressadas e  poluídas, falta de importância e valorização do trabalho e do  trabalhador em um mundo cada vez mais superficial onde a alienação da  força de trabalho é cada vez maior, assassinato da qualidade em prol da  quantidade, etc.
          Os guardiões do “status quo” apelam para o exemplo de Malthus,  economista britânico do final do século XVIII, que salientava a  importância do controle da natalidade em razão do crescimento da  população superar a produção de alimentos e que teve suas previsões  naufragadas diante de um mar de investimentos na ciência e no avanço da  produção em massa de alimentos, barateando os custos. Esse argumento  moderno, que concede à tecnologia o poder de resolver todos os nossos  problemas, ignora que a própria ciência nos apresenta o “paradoxo de  Jevons”. O britânico Willian Jevons, em seu livro; “O problema do  carvão” descreveu com maestria a paradoxal realidade de esperar que o  aumento da eficiência e da tecnologia resolva o problema da escassez de  recursos. Pelo contrário, Jevons provou que o aumento de tecnologia só  faz aumentar o consumo de recursos e não o contrário.
O  decrescimento econômico propõe a diminuição das atividades econômicas e  financeiras em escala mundial, com aplicação em escala local; menos  produção de bens comerciáveis, menos deslocamentos, menos quantidade de  horas trabalhadas, menos poluição e desmatamento. O decrescimento  enxerga no menos, o mais. Ivan Illich usa o exemplo do caracol que  constrói a sua concha adicionando uma a uma, espirais cada vez maiores  até parar bruscamente e começar a fazer voltas decrescentes cada vez  menores. Apenas uma espiral a mais faria com que sua concha fosse 16  vezes maior, sobrecarregando o caracol. Com uma concha 16 vezes maior do  que deveria ser, todo seu esforço seria direcionado para aliviar as  dificuldades criadas por esse erro de cálculo. Com esse tamanho, os  problemas multiplicam-se em progressão geométrica, enquanto a capacidade  biológica do caracol só poderá crescer em progressão aritmética. O  decrescimento utiliza como símbolo de suas idéias a sábia figura do  caracol.
A  crítica aos conceitos atuais de crescimento e riqueza da sociedade é  fácil de ser entendida por aqueles que não têm medo de mudanças. Exemplo  disso é a conceituação errada da economia atual da riqueza representada  pelo PIB dos países industrializados. Por que dizemos que o PIB é um  índice de medida de riqueza quando produzir por produzir, num ciclo  vicioso que se auto-alimenta, não traz bem estar e riqueza no real  sentido do termo? Porque o ciclo da economia atual não considera como  bem de capital os recursos naturais e a matéria-prima que as empresas  retiram da natureza sem compensações nem quantificações no impacto do  custo social, como se eles fossem infinitos?
             A proposta do decrescimento é ampla e envolve vários níveis de ação e  vários grupos sociais. O economista francês Serge Latouche, em seu  livro: “Pequeno Tratado do Decrescimento Sereno” lista algumas ações que  devem ser postas em prática por toda a sociedade para gerar o que ele  chama de “ciclo virtuoso do decrescimento”. São conhecidas como oito  “R’s”:
REAVALIAR:  A sociedade precisa reavaliar conceitos e valores. Os valores do  passado já não são os mesmos do presente e serão diferentes no futuro. A  sociedade precisa de cooperação e não competição; vida social e não  individualismo; precisa substituir os valores que tinha no passado tais  como consumo ilimitado e eficiência produtivista.
RECONCEITUALIZAR: Essa  mudança de valores, citada no item reavaliar, pressupõe outra maneira  de apreender a realidade. Reagir de forma diferente nas diversas  situações enfrentadas e dar conceitos diferentes de forma a criar  respostas e questionamentos mais criativos e próximos da realidade atual  da sociedade, com seus desafios e problemas.
REESTRUTURAR: Reestruturar  é mudar o enfoque industrial, adaptando o aparelho de produção a essa  mudança de mentalidade desejada. Essa transformação passa pela  desconstrução do capitalismo na forma que o conhecemos.
REDISTRIBUIR: Obtendo  essas mudanças conseguiremos uma mudança nas relações sociais o que  acarretará uma redistribuição dos bens, dos valores, dos saberes, das  riquezas e de tudo que for necessário para as próximas gerações.
RELOCALIZAR: Relocalizar  significa redirecionar o foco da produção de bens, mudando a  localização da produção das mega-indústrias para as unidades familiares  de forma a dar mais autonomia para o individuo ter uma vida com mais  significado, profundidade, felicidade, respeito e valor intrínseco. O  conceito leva em conta a necessidade de descentralização das  administrações e dos poderes públicos e privados.
REDUZIR: Esse  conceito é bastante abrangente e compõe o cerne da proposta do  decrescimento. Reduzir o nosso impacto na biosfera e nossa pegada  ecológica no planeta, reduzir o tamanho e o peso da população mundial  com metas programadas factíveis e graduais, reduzir nosso consumo de  produtos não essenciais ao novo modelo, reduzir nosso tempo gasto em  atividades que nos distancia da vida e do bem estar comum e individual.
REUTILIZAR e RECICLAR: Reutilizar  e reciclar já são atividades adotadas em nossa sociedade atual de forma  que não é tão necessário discorrer sobre elas. Todos já conhecem seus  benefícios e sabem como empreendê-las.
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